Eu acredito que, quando você desenha, tá colocando pra fora (mesmo que sem perceber) alguma coisa que ficou internalizada, arraigada no subconsciente de alguma forma. A ilustração de hoje é muito mais autobiográfica do que a maioria que passa por aqui, e foi uma maneira de colocar pra fora uma tempestade de coisas ruins que tenho ouvido outras pessoas falarem sobre mim nos últimos anos. Essa é uma ilustração sobre o peso que as palavras e as pessoas têm sobre a gente.
Eu nunca fui muito de falar abertamente pros outros sobre o que sinto – sempre fui uma pessoa esponjinha, daquelas que absorvem tudo ao entorno, até ficarem bem inchadas e pesadas do tanto que absorveram. Com o passar dos anos, fui encontrando válvulas de escape pra canalizar todas essas coisas absorvidas: fazendo atividades físicas, tocando violão… Mas a que sempre melhor funcionou foi desenhar.
No processo dessa ilustração em especial, eu passei por várias sensações: eu senti raiva, senti tristeza, senti culpa, senti indignação, senti injustiça, me senti desimportante. Como se estivesse entrado em um carrinho de montanha russa e tivesse mantido os olhos abertos até o final, eu fui lembrando de todas as vezes que ouvi essa palavra direcionada a mim, de todas as vezes que soube que eram isso que estavam pensando sobre mim.
E depois fui me sentindo livre, porque sabia que todos esses pensamentos ruins estavam saindo de mim de alguma forma. De alguma forma, olhar aquela palavra por horas, e repeti-la mentalmente toda vez que meu olhar batia nela, fez com que tudo isso saísse de mim. De repente, eu não me sinto mais estranha. Weird.
É claro que não é simples assim: desenhar, e pronto. Meu comportamento foi “estranho” por muito tempo (e ainda é!), e até aqui já foram discussões (umas mais agressivas que outras), brigas, atitudes infantis de quem eu julgava ter maturidade, descasos, cobranças e expectativas sem fundamento, e por aí vai. Mas encarar isso é libertador. É como encarar um medo. É uma mistura de coragem e de atrevimento.
Acredito que tudo isso faz parte do processo de autoconhecimento, de você se perceber enquanto ser humano, enquanto sujeito ativo, protagonista da sua vida. Eu não me sinto estranha – eu me sinto impotente, me sinto no mais das vezes em segundo plano nos ambientes em que eu não deveria ser, sentir. Sinto algo que foi imposto lá no começo, na infância: agir da maneira que esperavam. Em caso contrário… repreensão.
Nessa dinâmica quase adolescente, tenho me percebido diferente: pensado diferente, agido diferente, discordando e questionando tudo o que me foi imposto como “certo”. E esse tipo de comportamento, no mais das vezes, é causador de repulsa. Falta compreensão, falta humildade para reconhecer os erros. Pedir desculpas é quase uma sentença de morte. É mais importante estar certa do que ter argumentos sólidos e desenvolver um diálogo saudável. As consequências disso vêm como uma chuva de estilhaços de vidro em mim.
Eu nunca tive muita certeza de quem eu sou, de quem eu quero ser, e acho isso normal – a gente tá sempre em processo de (re)construção, mesmo. O meu problema sempre foi absorver demais todas as palavras, todos os olhares revirados, todas as reações negativas como algo ruim, e levar a culpa por “ser” tudo isso. E hoje em dia, na minha meta diária de ser uma pessoa melhor, percebo que eu não sou esse monstro que pintaram de mim. Não é arrogância. É um despertar, um abrir de olhos.
Tudo isso está nos olhos de quem vê. Que culpa eu poderia ter?
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Para não perder o costume, os materiais que utilizei nessa ilustração foram papel Canson Torchon 270g/m², aquarelas Pentel, Ecoline dourada, caneta Tombow e marcadores brancos.
Lorene Santiso
Nossa, Juliana. Acho que acabei me identificando muito com tudo isso. Mas no meu caso, era a falta de coragem para assumir-me "estranha". Durante toda a minha vida fui rotulada por várias palavras que hoje não tem o menor significado para mim. E que ainda não eram as palavras que realmente me definiriam. Acho que somos privilegiadas com o poder de questionar a nossa sociedade e o nosso lugar nela e as pessoas não entendem que podem fazer isso. Acredito que elas querem se encaixar e pronto, não buscam quem realmente são e punem aqueles que buscam. Te desejo muito sucesso e força. E sua válvula de escape é uma coisa linda. 🙂 Desejo que você possa sempre estar ilustrando um sentimento muito bacana que consegui sentir depois de uns anos: o sentimento de superação e orgulho. Ser "estranha" nos torna muito especiais. As pessoas "estranhas" são as melhores pessoas pra se ter por perto!! Na minha opinião, pelo menos <3 Beijinhos Ju, e tenha um maravilhoso dia 🙂
Anna Costa
Acho que essa pintura em especial te deixou de alma lavada! Linda, belíssima!
Vitor Drummond
As suas ilustrações são muito lindas, eu não perco nenhum #IlustraSunday nos domingos.
E como você eu libero tudo que tem de ruim mais escrevendo
Carol Achilles
Sempre acompanho seu blog, mas nesse post eu tenho que comentar! Eu sou "weird since 1982"! rs.. Sempre soube que eu era diferente, mas sempre gostei!.. não sou uma Maria-vai-com-as-outras.. Desde pequena sabia quando as pessoas falavam mal ou riam de mim. Mas isso nunca me abalou.. Eu não precisava ser amada ou aprovada por todos ao meu redor, só precisava do amor de Deus, e Ele nos ama como um Pai, não é? Meu refúgio e meu consolo estão no amor infinito do Senhor, que me aceitou como sou! : )
Parabéns pelo seu talento, Juliana! A delicadeza do seu coração emana pelo seu trabalho e é lindo! Bjs
Lidiane Dutra
Weird Since 1984 com muito amor <3
Passou um filme aqui na minha cabeça, enquanto lia o teu post. Já ouvi tanta coisa que me magoou muito, que me fez sentir fora de lugar em quase todos os ambientes, mas o tempo vai passando e a gente aprende – meio que na marra – a relevar, dar a resposta correta e deixar que a vida resolva. Não é fácil… mas prefiro ser a estranha/louca/inconformada do que ser a pessoa que vive dentro da caixinha e acha tudo lindo, a vida toda.
Não deixa que ninguém fale que tu ou o teu trabalho não são importantes, viu? A vida é muito curta pra gente desperdiçar com quem não vale a pena, pra dar ouvidos a quem não se importa com nosso bem-estar.
Um beijão, chuchu :**
Aline Delmonte
"Weird since 1987"
Sou dessas que "absorve" as coisas sabe? Faço isso desde meus 6 anos de idade e me tornei uma pessoa bem difícil de me apegar. Fui melhorar disso bem mais velha e foi graças a internet. Eu mudei muito, sou bem mais faladeira do que antes, e as vezes por ter sido sempre caladona as vezes passo dos limites, pois eu gosto de fazer as pessoas ao meu redor se sentirem bem e gosto de fazer as pessoas sorrirem. E sou rotulada de estranha até hoje, mas eu não ligo mais.
Para me ajudar a "aguentar" esses momentos ruins foi a música também. Acho ótimo que você descobriu o desenho para se libertar e não ficar com essa coisa ruim dentro de você, mas pega um dia para ouvir músicas dançantes e dance até suar, cante junte. Toda a maldade do mundo que estão jogando em cima de ti, vão sair com o suor da dança e com a sua voz dizendo "haters gonna hate"
AnaGPires
Oi Ju! Tudo bem?
Nossa ual! Que texto lindo!!!! Eu adorei a sua ilustração de hoje,mas esse texto me encantou mais ainda. Tentar ser uma pessoa melhor,nunca é fácil,ainda mais na fase da adolescência. Nossa são tantas reviravoltas,tanta coisa nova.
Eu sofri e sofro tanto por causa dessa imagem que me pintaram: de ser uma pessoa diferente na sociedade e não eu mesma! Sou complicada e dramática,sempre tenho uma resposta na ponta da língua,mas nunca pude ser o que sou na frente de outras pessoas. Triste,mas é assim….
Porém se liberte,é a melhor coisa que um ser humano pode fazer SER LIVRE!!!
Beijos Pão de Queijo!!!
Vitória Gomes
Essa ficou especial, Weird kk
Aiana Lopes
Me encantei pelo texto e pela ilustração, acho que todo mundo pode se identifica um puco com isso. Não quero perder nenhum #ilustrasunday
Jaqueline Teixeira
Muito amor com essa ilutração e com a sua descrição. Compartilho desse sentimento contigo e todos os meus sentimentos passo ou melhor tento passar para os desenhos.
Jess
Ju, me identifiquei TANTO, mas TANTO com você!
tbm sempre me senti estranha, totalmente diferente das expectativas que todos tinham para mim. Tão difícil crescer com essa sensação que não somos nada né?
Mas olha, você é uma pessoa incrível. muito humana. linda por dentro e por fora. Com certeza acredito muito que tudo depende e está nos olhos de quem vê, muito mais do que nas pessoas em si.
Wanila Goularte
Nossa Ju, me identifiquei muito com tudo que você escreveu. Detesto a cobrança, o julgamento e os olhares tortos. Eu nunca sei o que fazer e me sinto cada dia mais perdida dentro de mim, vivendo do jeito que dá pra viver. Mas olha, espero que você consiga descarregar todas essas coisas nesss desenhos incríveis, porque pelo pouco que eu conheço de você, já posso ver como é uma pessoa maravilhosa!
Colecionadoras de moda
Oi Ju, sou uma esponjinha também.
Odeio sair falando o que sinto por ai, mas no meu caso acabo sendo julgada como a pessoa perfeita/metida. Que nada na vida dá errado.
As pessoas acham que tem o direito de falar já que eu não reclamo quando falam.
São situações diferentes da sua forma de se sentir estranha rs, mas eu me sinto quase igual. Quem me conhece fala que não entende como minha aparência não bate com "quem eu sou", adoro games, livros, desenhos.. mas meu outro lado ama moda e estampas.
Falei demais pra quem não fala nada rs.
Amei sua ilustração e seu desabafo.
Kisses
Juliana Rabelo
Muito obrigada pela força, Lorene! Sempre me senti feliz por poder ter olhos abertos e poder questionar as coisas ao meu redor, e as pessoas que mais gosto na vida são "estranhas" como eu, mesmo :~ Beijos!
Juliana Rabelo
Com certeza, Anna!
Muito obrigada :~)
Juliana Rabelo
Muito obrigada, Carol! No meu caso, eu não sabia como gostar de ser 'estranha', já que sempre fui assim e sempre cresci com repreensões a esse tipo de comportamento. Mas tudo é uma questão de autoconhecimento e de aceitação, e fico feliz que você seja feliz assim (eu também tô aprendendo a ser) :~)
Beijos!
Juliana Rabelo
Acho que já tô vestindo a camisa, Lidy! Também sinto orgulho de ser uma pessoa ativa e questionadora, e acho muito triste quem se contenta com o comodismo. Acho que principalmente nós, das artes, já passamos por isso algum dia. A falta de compreensão das pessoas é algo que machuca muito. Mas a gente segue praticando o 'foda-se' e se preocupando com quem se preocupa com a gente <3
Beijos!
Juliana Rabelo
Obrigada (?) 🙂
Juliana Rabelo
Muito obrigada, Aiana!
Juliana Rabelo
Tamo junta! <3
Juliana Rabelo
Oi, Ana! Vamos seguindo o caminho da autoaceitação, realmente é libertador 🙂
Beijos e obrigada pelo comentário!
Juliana Rabelo
Me identifiquei muito contigo, Aline! Eu sou bem quieta, mas quando tô com as pessoas, falo bastante e tento sorrir bastante também, porque acho bom sentir que as pessoas gostam de estar perto de mim :~
Eu preciso reunir muita coragem pra dançar, mas agradeço muito a dica! Deve ser mesmo revigorante <3
Juliana Rabelo
Poxa, Jess! Eu só tenho a dizer o mesmo sobre você, de verdade. Acho que a gente tem mais é que se aceitar e ter consciência do que/quem somos, e deixar que o resto se dane. Mas é tão difícil :~
Você também é uma pessoa maravilhosa, muito simpática, querida e muitas outras coisas que nem consigo escrever :~ Inclusive, aproveitando o comentário pra dizer que tô adorando te conhecer melhor e descobrir cada vez mais pontos de convergência contigo <3
Beijos!
Juliana Rabelo
Oi, flor! É assim mesmo, as pessoas acham muito difícil compreender e aceitar o que as outras pessoas têm e são. Mas a gente segue persistindo e afirmando nossa identidade e nossos princípios 🙂
Beijos e obrigada!
Juliana Rabelo
Muito obrigada, Wanila :~ acho que todo mundo que simplesmente pensa de uma forma diferente já deve ter passado por algo assim, o que é uma pena :~ eu também espero muito pra que você consiga se libertar dessas coisas ruins, viu? ♥
Juliana Rabelo
Muito obrigada, Vitor! 🙂
Escrever é muito bom, mesmo! Fico feliz que você consiga usar isso à seu favor 🙂